Plano B

Opinião de António Franco

António Franco atira-se a Mariana Mortágua como gato a bofe...

Após o 25 de Abril, assistiu-se em Portugal ao inicio de uma construção desenfreada. Os concelhos viram nessa nova construção uma fonte inesgotável de receita, que suportou durante muitos anos os cofres camarários. Alenquer não foi excepção. Com efeito, no concelho instalou-se uma política de laissez faire – laissez passer, que 40 anos depois se conclui ter sido desastrosa. Temos vários exemplos. A urbanização da Barrada, vulgarmente conhecida como “Dallas”, foi do ponto de vista urbanístico um descalabro, arrastando esse mesmo descalabro para o ponto de vista social. Hoje a Barrada transformou-se num mega gueto, associado popularmente a casos de pequena delinquência e de falta de segurança. Ainda que nos últimos anos a câmara tenha tentado atenuar o erro, através da construção de espaços verdes, as torres habitacionais do Carregado continuam a simbolizar aquilo que de pior se fez, a nível urbanístico, na zona sul do concelho.
A quinta do Brandão é outro exemplo. A urbanização do Brandão tem na sua génese uma boa ideia. A construção numa zona nobre de Alenquer, sobranceira à vila. Teve depois na sua execução uma ideia surreal… Qualquer pessoa veria que seria necessário Alenquer crescer demograficamente a um ritmo alucinante para que as centenas de fogos aprovados fossem preenchidos. Mas houve um erro ainda maior: deixar o palácio da quinta, exemplo máximo de uma casa senhorial, votado ao abandono, é o exemplo flagrante de uma insensibilidade patrimonial, trocada por esqueletos de betão, que parecem ter saído de uma saga qualquer do tipo “Mad Max”. Construir mega empreendimentos tendo como base uma suposta obra, é tão arriscado como comparar um Porsche, garantindo ao vendedor que lhe vai sair o euromilhões. Alenquer pagou caro a suposta vinda do Aeroporto. Enquanto que na Europa as obras aeroportuárias sofreram retrocessos na sua construção, em Portugal criou-se a ilusão de que tínhamos estrutura financeira para uma obra que tinha tanto de faraónica como de desnecessária.
Vou dar dois exemplos do que acabo de dizer. O Aeroporto de Amesterdão, que tem muito mais tráfego que qualquer Aeroporto Português, tem sido sistematicamente ampliado, à medida das necessidades resultantes do aumento de tráfego. Em Portugal avançou-se com a ideia de uma obra de raíz. Faz lembrar a história do euro 2004. Enquanto que em 2000 a Holanda e a Bélgica não tiveram pejo em organizar em conjunto o europeu de futebol, limitando-se a restruturar estádios existentes, em Portugal arrancou-se para a construção de raiz de uma serie de estádios hoje votados ao abandono, e que levaram construtores e municípios à falência.
Mas existe outro exemplo flagrante de rigor e organização a nível da construção de aeroportos: o novo aeroporto de Berlim. A cidade de Berlim, cuja população ronda os 5 milhões de pessoas, tinha 3 aeroportos: Tegel, Schonefeld, e Tempelhof. Em nome da diminuição de custos, encerrou faseadamente cada um deles, construindo apenas um. Berlin – Brandenburg. Em Lisboa, pelo contrário, ficariam a funcionar em simultâneo duas estruturas, que a nível financeiro custariam ao erário público milhões de euros anualmente. Os municípios têm que entender que a época do investimento público acabou. Têm que potenciar o que de mais atractivo possuem. Têm que se abrir à sociedade e fazer dessa abertura o motor de desenvolvimento que permita um equilíbrio estável entre sustentabilidade, investimento privado e qualidade de vida. Ninguém hoje pode ter dúvidas de que se em vez de prédios, no Brandão, tivessem sido construídas vivendas, hoje porventura a zona em questão estaria completamente diferente, e que essa diferença se traduziria quer numa melhoria de condições de vida para quem lá habitasse, quer fundamentalmente na melhoria do skyline de Alenquer. A ambição desmedida aliada à insensibilidade é sempre um cocktail explosivo. Em Alenquer não houve essa noção. Não existiu um plano B. E hoje, quando vemos que a generalidade dos construtores se encontram em dificuldades financeiras, quer a nível local quer a nível nacional, começamos a ter a noção exacta do erro resultante da ideia de que todos poderiam enriquecer em pouco tempo. Começamos a ter a noção exacta do nosso tamanho. Há nesta viragem de paradigma de desenvolvimento uma lição a reter. Podemos e devemos aprender com os erros do passado, de forma a evitá-los no futuro. Mas devemos, enquanto município, potenciar o que de melhor possuímos, não ficando dependentes de acreditarmos em empreendimentos fictícios para garantirmos um nível de vida condigno para quem vier depois de nós.

VIAAntónio Franco
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