A Política e o Aterro da Triaza

Opinião de André Salema (Fevereiro de 2020)

Os decisores políticos são eleitos com base num programa que é sufragado nas urnas e que viabiliza a sua eleição. Não me lembro em momento algum que a equipa liderada pelo então Presidente, Dr. Joaquim Ramos, tivesse plasmada, no seu programa, a pretensão (preto no branco) de instalar um aterro na Quinta da Queijeira (antiga Zubareia). Para além de ser uma ideia de jerico, não era certamente uma necessidade do Concelho de Azambuja, nem seria algo que o tivesse beneficiado na eleição que pretendia obter.

A própria aprovação em Assembleia Municipal da “medida remendo” a que se chamou utilidade pública, e que possibilitou a concretização deste projecto, foi um ato de profundo desrespeito pelos cidadãos. A utilização do mecanismo de utilidade pública para ultrapassar determinados condicionantes legais vulgarizou-se tanto hoje em dia que o conceito se banalizou por completo e desvirtua totalmente o fim que com o mesmo se pretendeu.

Em grande parte, e no que ao Concelho de Azambuja diz respeito, isto só acontece porque o Concelho não dispõe de um Plano Director Municipal à sua dimensão, que organize e planeie o território com vista ao seu perfeito desenvolvimento. É por isso que seria aconselhável efectuar um levantamento de todas as utilidades públicas que foram atribuídas no Concelho, com o fim de aferir se o objectivo primeiro que mereceu tal distinção continua a ser cumprido. Deixo a nota, para a quem a quiser e puder tomar.

O aterro da Quinta da Queijeira afecta neste momento a qualidade de vida de muitos Azambujenses, em termos económicos, ambientais e de saúde pública. Duvido que alguém com dois dedos de testa tenha o desejo de investir numa vila com problemas ambientais desta magnitude. Questiono mesmo se temos a consciência do impacto na fixação de famílias e na transacção imobiliária nos locais mais afectados.

Qualquer medida desta dimensão que afecta a qualidade de vida dos cidadãos e o desenvolvimento do Concelho, se não claramente plasmada em programa eleitoral, deveria ser sujeita a escrutínio público em Referendo Municipal. Em tempos António José Matos e Conceição Maurício Sousa propuseram esta medida para que a população pudesse decidir em consciência, depois de um amplo debate, se o Município deveria entregar, ou não, a concessão das águas e saneamento a privados, que vincula neste momento o Município de Azambuja durante 30 anos. Convém lembrar que a proposta de referendo foi chumbada pela Assembleia Municipal de então.

Nessa altura o Município de Azambuja apostava como nunca em políticas e projectos ambientais, e estranhamente levou por diante a pior decisão política da história democrática do Concelho de Azambuja. Desculpem, mas por respeito à minha geração e às gerações vindouras está na altura de admitir que fizeram trampa e da grossa.

Se alguém pensa que é possível encerrar esta instalação a curto-médio prazo, que tire o cavalinho da chuva; aliás, que tenhamos todos a consciência que a procissão só agora vai no adro. A construção de duas novas células é um objectivo que esteve sempre em cima da mesa, sendo a última célula a de maior dimensão. Se temos hoje problemas, nem quero ver o que para aí virá. Actualmente a Câmara Municipal de Azambuja tem tido uma postura opaca na gestão deste processo… sei que foram executadas algumas iniciativas e outras se seguirão. Quero com isto dizer que é preciso transmitir à população aquilo que já foi feito e qual a estratégia futura.

Mas quem critica também tem o dever de propor alternativas e um caminho… a Câmara Municipal de Azambuja poderia ter tido uma posição privilegiada nesta matéria se tivesse tido a coragem de assumir a sua participação na gestão daquela exploração, como tinha sido previamente negociado. Não estou a falar obviamente de retirar vantagem económica deste negócio, mas sim utilizar esta participação como elemento dissuasor, na vigilância e controlo desta operação, prevenindo uma série de constrangimentos para as populações.

Será que não estamos em condições para reverter estes acontecimentos? Estamos à espera de quê para nos posicionamos junto dos grupos parlamentares e associações ambientalistas, numa altura em que o ambiente é um tema Nacional? Estamos à espera de quê para perceber as estratégias de outros municípios que passam pela mesma situação que o nosso? Estamos à espera de quê para propor um grupo de trabalho no âmbito da Associação Nacional de Municípios Portugueses, para que junto do governo envide esforços sérios no sentido de suspender, o mais rapidamente possível, este negócio internacional do Lixo? Utilizem todas as ferramentas democraticamente disponíveis para combater este problema!

Deverá ser também equacionado outro caminho, o de provar que esta infraestrutura não reúne nem cumpre os requisitos técnicos e ambientais para a sua exploração, o que não será difícil de fazer, diligenciando junto das autoridades competentes a suspensão e cessação da licença para a “realização de operações de gestão de resíduos” naquelas instalações e recorrendo até a vias judiciais.

É apanágio popular dizer que “quem cala consente”, pois eu não quero consentir que a minha filha cresça e viva na “terra do lixo”! Que nunca mais tenham a audácia de cometer uma atrocidade desta dimensão para com os munícipes deste Concelho!


VIAAndré Salema
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