Dando continuidade à crónica publicada no passado de Junho, com o título “Fogos e mais fogos”, opinei então que “os pequenos proprietários não têm rendimentos para limpar as matas, e não basta a apropriação pública de umas centenas de pequenas parcelas de terreno abandonados na zona do minifúndio, no Centro e Norte do país, onde ocorrem a maior quantidade dos incêndios e de área ardida. De nada serve a apropriação de pequenas parcelas isoladas de terreno, se as maiores propriedades ficam fora de prevenção”.
Contudo, é preciso urgentemente enfrentar o assunto de frente e sem complexos; não sendo eu especialista de nada, quero deixar aqui algumas ideias sintetizadas sobre o que penso do assunto.
Começo por enunciar algumas regras da legislação urbanística: como é do conhecimento geral, não se pode construir em todo lado, a belo prazer dos proprietários dos terrenos, embora muitas pessoas pensem o contrário. Na verdade, existem regras muito rigorosas para evitar a bagunça e o abuso do direito de terceiros e da fruição pública geral.
Tal como não se pode plantar eucaliptos, pinheiros ou acácias por todo lado. Existem algumas regras definidas pela administração pública, apesar de tudo insuficientes, daí os incêndios frequentes junto de habitações que dificilmente podem ser combatidos e provocam avultados danos materiais e pessoais. Durante este verão, só na região de Pedrogão Grande, arderam cerca de 50.000 ha de floresta e morreram 64 pessoas. Em 15 e 16 de Outubro arderam mais de 400.000 ha, tendo-se registado mais de 500 ignições só num dia.
Salvo melhor opinião, há que estabelecer regras para a reforma florestal semelhantes a uma que existe no âmbito do direito do urbanismo: “o princípio da perequação” que foi introduzido com o objectivo de promover a equidade no processo de urbanização, de forma a distribuir os benefícios e encargos de uma operação de urbanização entre os agentes públicos e privados.
Para melhor entendimento dos leitores, deixa-se um breve exemplo: é frequente existir um terreno urbano ou urbanizável bem situado para construção, que não tem área suficiente para uma urbanização rentável, podendo este terreno valer cerca de 40 euros o metro quadrado. Todavia, o dito terreno apto para construção não é suficiente para acolher uma determinada urbanização, pois exige-se sempre cedência de áreas para zonas verdes e para equipamentos colectivos, como escolas, centros de saúde, etc.. Mas, confinante com o terreno a urbanizar, pode existir um prédio rústico classificado como zona agrícola ou ecológica, que poderá valer apenas 1 euro por metro quadrado.
Assim, os particulares poderão associar-se para urbanizar o terreno com aptidão para tal fim, permitindo a utilização do terreno rústico para uma zona verde de apoio à urbanização, distribuindo-se equitativamente o proveito da venda de lotes pelos titulares dos terrenos urbanos e rústicos.
Ora se em termos agrícolas forem estabelecidas condicionantes com áreas definidas onde só se pode florestar com arborização não combustível, intercaladas com zonas de pinhal, eucaliptos, carvalhos ou choupos, será possível reservar os vales confinantes com linhas de água para agricultura, que também podem servir como atalhadas ou corta fogos e salvaguardando habitações, vias rodoviárias e ferroviárias e ainda caminhos rurais para servidão dos espaços florestais e para acesso dos bombeiros.
Nestes termos, será necessário enveredar pelo emparcelamento previsto desde a década de cinquenta do século passado, através do agrupamento ou Unidades Agrícolas e Florestais – UAF nº. 1, 2, 3 etc., por freguesias ou concelhos. As confrontações poderão ser definindo através de coordenadas geográficas.
Com o agrupamento das terras e utilizando mecanismos de compensação adequados, os interesses proprietários de terrenos agrícolas onde apenas podem ser plantadas árvores menos combustíveis poderão ser acautelados com o maior valor resultante de outro tipo de arborização mais rentável, proporcionando um rendimento equitativo para todos eles. Através dos referidos agrupamentos, as florestas poderão ser melhor geridas e limpas, aproveitando-se o material recolhido na limpeza das matas através de centrais de biomassa, o que poderá resultar no acréscimo de rendimento dos proprietários associados. Para tal efeito, poderão ser estabelecidos modelos societários (sociedades por quotas, anónimas, ou unipessoais), ou em que o capital possa ser equiparado a metros quadrados.
Para coordenar tudo isto, será preciso criar uma direcção comum para a protecção civil, ordenamento do território, com envolvimento da administração central e local, bem como dos proprietários com terrenos nas áreas a delimitar para as Unidades Agrícolas e Florestais.